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domingo, 30 de dezembro de 2018

OS ANIMAIS E A PESTE - De Monteiro Lobato

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               Em certo ano terrível de peste entre os animais, o leão apreensivo, consultou um mono de barbas brancas, 
               - Esta peste é um castigo do céu - respondeu o mono, e o remédio é aplacarmos a cólera divina sacrificando aos deuses um de nós. 
               - Qual? - perguntou o leão. 
               - O mais carregado de crimes. 
               O leão fechou os olhos, concentrou-se e, depois duma pausa, disse aos súditos reunidos em redor: 
               - Amigos! É fora de dúvida que quem deve sacrificar-se sou eu. Cometi grandes crimes, matei centenas de veados, devorei inúmeras ovelhas e até vários pastores. Ofereço-me pois, para o sacrifício necessário ao bem comum. 
               A raposa adiantou-se e disse: 
               - Acho conveniente ouvir a confissão das outras feras. Porque, para mim, nada do que Vossa Majestade alegou constitui crime. Matar veados - desprezíveis criaturas; devorar ovelhas - mesquinho bicho de nenhuma importância; trucidar pastores - raça vil, merecedora de extermínio! Nada disso é crime. São coisa até que muito honram o nosso virtuosíssimo leão. 
              Grandes aplausos abafaram as últimas palavras da bajuladora - e o leão foi posto de lado com impróprio para o sacrifício. 
              Apresentou-se em seguida o tigre e repete-se a cena. Acusa-se ele de mil crimes, mas a raposa prova que também o tigre era um anjo de inocência. 
               E o mesmo aconteceu com todas as outras feras. 
               Nisto chega a vez do burro. Adianta-se o pobre animal e diz: 
               - A consciência só me acusa de haver comido uma folha de couve na horta do senhor vigário. 
               Os animais entreolharam-se. Era muito sério aquilo. A raposa toma a palavra. 
               - Eis amigos, o grande criminoso!  Tão terrível o que ele nos conta, que é inútil prosseguirmos na investigação. A vítima a sacrificar-se aos deuses não pode ser outra, porque não pode haver crime maior do que furtar a sacratíssima cousa couve do senhor vigário. 
              Toda a bicharada concordou e o triste burro foi unanimemente eleito para o sacrifício. 
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Aos poderosos tudo se desculpa; aos miseráveis nada se perdoa. 


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- Viva! Viva!... Esta é a fábula do Burro Falante - e Pedrinho recordou todos os incidentes daquele dia lá no País das Fábulas. 
Essa história estava se desenvolvendo, e no instante em que as feras iam matar o pobre burro, o Peninha derrubou do alto do morro uma enorme pedra sobre as fuças do leão. 
- Salvamos o Conselheiro - disse Emília - mas o fabulista pegou um segundo burro para poder completar a fábula. Pobre segundo burro !... - e Emília suspirou. 
- Esta fábula me parece muito boa, vovó - opinou Narizinho. 
- é, minha filha. Retrata as injustiças da justiça humana. A tal injustiça humana é implacável contra os fracos e pequeninos - mas não é capaz de pôr as mãos num grande, num poderoso. 
- Falta um Peninha que dê com pedras do tamanho do Corcovado no focinho do Leão da justiça. 
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Fonte: Fábulas de Monteiro Lobato - Coleção Educar.

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Nicéas Romeo Zanchett 

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