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sábado, 29 de dezembro de 2018

O CORVO E O PAVÃO - De Monteiro Lobato

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              O pavão, de roda aberta em forma de leque, dizia com desprezo ao corvo: 
               - Repare como sou belo! Que cauda, hein? Que cores, que maravilhosa plumagem! Sou das aves a mais formosa, a mais perfeita, não? 
               - Não há dúvida que você é um belo bicho - disse o corvo. Mas, perfeito? Alto lá! 
               - Quem quer criticar-me! Um bicho preto, capenga, desengraçado e, além disso, ave de mau agouro... Que falha você vê em mim, ó tição de penas? 
               O corvo respondeu: 
               - Noto que para abater o orgulho dos pavões a natureza lhes deu um par de patas que, faça-me o favor, envergonharia até a um pobre diabo como eu... 
               O pavão, que nunca tinha reparado nos próprios pés, abaixou-se e contemplou-os longamente. E, desapontado, foi andando o seu caminho sem replicar coisa nenhuma. 
               Tinha razão o corvo: não há beleza sem senão.


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- Que quer dizer "senão", vovó? 
- Aqui nesta frase quer dizer defeito. 
 - E porque senão é defeito? 
- Porque o modo de botar um defeito nalguém ou nalguma coisa era sempre por meio do "senão" - e por fim essa palavra ficou sinônima de defeito. "Fulana seria muito bonitinha, se não fosse aquele nariz  de coruja."  "Esse doce estaria ótimo, se não fosse estão doce demais" - e assim por diante. 
- Mas é verdade, vovó, que não há mesmo beleza sem senão? 
- A fábula diz que não há e as fábulas sabem... 
- São sabidíssimas, sim! - continuou Emília. E a dos filhos da coruja é a mais sabida de todas. Quem é que andou inventando as fábulas, Dona Benta? Foram os animais mesmos? 
Dona Benta riu-se. 
- Não, Emília. Quem inventou a fábula foi o povo e os escritores as foram aperfeiçoando.  A sabedoria que há nas fábulas é a mesma sabedoria do povo, adquirida à força de experiências. 
- Mas não haverá mesmo beleza sem senão, vovó? - insistiu a menina. 
- Há, sim, minha filha. Para mim, por exemplo, você é uma belezinha sem senão. 
Emília torceu o nariz. Depois prometeu escrever uma fábula com o título: "Os netos da coruja."

Fonte: Fábulas de Monteiro Lobato - Coleção Educar.

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Nicéas Romeo Zanchett 


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