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sábado, 29 de dezembro de 2018

O SABIÁ NA GAIOLA - De Monteiro Lobato

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              Lamentava-se na gaiola um velho sabiá. 
              - Que triste destino o meu, nesta prisão toda a vida... E que saudades dos bons tempos de outrora, quando minha vida era um contínuo pular de galho em galho em procura de laranjas mais belas... Madrugador, quem primeiro saudava a luz da manhã era eu, como era eu o último a despedir-me do sol à tardinha. Cantava e era feliz...
              Um dia, traiçoeiro visgo me ligou os pés. Esvoacei, debati-me em vão e vim acabar nesta gaiola horrível, onde saudoso choro o tempo da liberdade. Que triste destino o meu! Haverá no mundo maior desgraça? 
              Nisto abre-se a porta da sala e entra o caçador, de espingarda ao ombro e uma fieira de pássaros na mão. 
              Ante o espetáculo das míseras avezinhas estraçalhadas a tiro, gotejantes de sangue, algumas ainda em agonia, o sabiá estremeceu. 
               E horripilado verificou não ser dos mais infelizes, pois que vivia e ainda não perdera a esperança de recobrar  a liberdade de outrora. 
               Refletiu sobre o caso e murmurou consigo: 
               - Antes penar que morrer... 

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- Será verdade isso, vovó? Será certo esse "antes penar que morrer?"
- Deénde da ideia que a gente faz da morte, minha filha. Quem a considera um Mr. Ceifas, ah, esse prefere a amável visita de Mr. Ceifas ao tal penar. 
 - E que é penar? 
- É sofrer dor prolongada, é sofrer um castigo, uma pena. 
- Mas como é que a pena é ao mesmo tempo dor e aquilo das aves? Isso atrapalha a gene. Emília, quando ainda era uma coitadinha que estava decorando as palavras, uma vez confundiu as duas penas - a pena dor e a pena, e veio da cozinha dizendo: "Tia Nastácia  está contando para o visconde que para pena de costas o melhor remédio é passar iodo com uma dor de galinha." Ela havia trocado as bolas... 
- São coisas do latim, minha filha. Nessa língua duas palavras parecidas: poena e penna. A primeiro virou, em nossa língua, "pena" - e a segunda ficou penna mesmo - a tal das aves. 
- E depois a penna das aves perdeu uma peninha e virou pena com um n só, igual à pena-dor - concluiu Emília, e agora está aí, está aí... 
Esta aí o que, Emília?
- Está aí um grande embrulho...
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Fonte: Fábulas de Monteiro Lobato - Coleção Educar.

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Nicéas Romeo Zanchett 

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